terça-feira, 28 de julho de 2015

Crédito à habitação. Cuidado com os truques para reduzir o spread

Os custos do crédito à habitação estão a baixar. E se a Euribor – indexante utilizado na maioria dos contratos – está a bater na trave do zero em todos os prazos e, a três meses, já caiu para valores abaixo desta fasquia, o spread (margem de lucro dos bancos) também tem vindo a decrescer. Mas nem tudo são boas notícias. “Por um lado, não são todos os consumidores que conseguem aceder às condições mais vantajosas. E, por outro, os bancos estão a preparar-se para, em conjunto com o contrato de crédito, comercializarem produtos financeiros cuja compreensão não está ao alcance da generalidade dos consumidores – tudo com o criticável aval do Banco de Portugal”, denuncia a Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor (DECO).

A entidade fez uma ronda pelas condições do crédito à habitação dos sete maiores bancos a operar em Portugal e chegou à conclusão de que os melhores negócios são, em regra, propostos a quem peça um empréstimo com uma mais baixa relação entre o financiamento e a garantia e contrate mais produtos no banco. “Nada de novo. Mas a última premissa nem sempre é verdadeira. Por vezes, os custos associados à contratação destes produtos anulam as reduções obtidas no spread. No campo minado da contratação de produtos para reduzir o spread, a única forma de comparar propostas de forma fiável continua a ser a taxa anual efectiva revista (TAER)”, diz a associação.

O que é certo é que, nos últimos meses, os spreads do crédito à habitação começaram a descer. No entanto, de acordo com a DECO, “estamos longe dos confortáveis valores que pontificavam antes da crise”. Mas vamos a números. Os spreads médios para quem não contrata produtos adicionais, entre Julho de 2005 e o mesmo mês de 2008, mantiveram-se estáveis: mínimo entre 0,5 e 0,7% e máximo entre 1,5 e 1,6%. Nos quatro anos seguintes subiram até 5% (mínimo) e 6,25% (máximo), patamares onde permaneceram cerca de um ano e meio. Em 2014, os valores sofreram uma alteração e encontram-se agora próximos dos 3,7% (mínimo) e 4,8% (máximo).

“Apesar de a Euribor estar vizinha do zero, é provável que venha a subir a longo prazo, o que, num crédito com spread acima de 3%, pode originar um desequilíbrio no orçamento familiar”, salienta a DECO e, como tal aconselha os consumidores a que, no caso de virem a precisar de um empréstimo, tentem negociar um spread tão reduzido quanto possível. “Tenha ainda em atenção que o acesso está agora mais difícil. Não só a avaliação do risco associado ao cliente se tornou mais exigente como a percentagem de financiamento face ao valor da avaliação é mais reduzida. Apenas uma pequena parte dos bancos empresta acima de 80% do valor da avaliação e, nestes casos, não é de esperar que consiga as condições mais vantajosas”, acrescenta.

Novos contratos

A DECO diz ainda que, desde o início de 2015, tem recebido relatos de que os bancos tentam limitar a evolução das taxas de juro, por exemplo prevendo cláusulas para impedir que seja cobrado um valor inferior ao spread. “Entretanto, o Banco de Portugal emitiu um esclarecimento. As condições contratuais dos créditos em vigor, diz o regulador, são para cumprir. Quer isto dizer que, se a Euribor cair para o vermelho, irá mesmo anular parte ou a totalidade do spread”, salienta, aplaudindo esta decisão.

Mas critica a solução encontrada para os novos contratos. “O Banco de Portugal aconselha as instituições a proporem aos clientes que, com a contratação do crédito, subscrevam um produto financeiro derivado. Em suma, dá carta branca aos bancos para pressionarem o cliente a contratar produtos de elevado grau de complexidade cujos riscos dificilmente consegue avaliar e que até poderão ser elevados”, acusa.

De acordo com a associação, e pela ronda que fez no mercado, “as cláusulas que protegem os bancos são uma constante”. E dá exemplos: nos casos do BBVA, do Abanca e do Deutsche Bank, não há relação directa com as Euribor negativas, em que são previstas salvaguardas mais genéricas e que consideram a possibilidade de as instituições modificarem o spread face a alterações decorrentes do mercado (por exemplo, de “qualquer encarecimento do crédito” ou do “agravamento do custo de fundos para o banco”). “Estas justificações têm um sentido de tal forma lato que, na prática, permitem aos bancos mudar o spread sempre que o desejarem.”

Já o Crédito Agrícola e o Santander Totta referem que a taxa nominal não pode ser inferior ao spread. Ou seja, uma Euribor negativa passa automaticamente a zero.
Fonte: Jornal I

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